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Muitas tardes, o poema resume-se à cinza

Muitas tardes, o poema
resume-se à cinza, ao que resta
de algo que se consome em lentidão
algo que ainda o vento
não levou consigo.
O esquecimento não acontece por acaso.
Os olhos demoram-se nas imagens
empoeiradas, num ou noutro
detalhe mais persistente em nitidez
para logo desaparecerem como um
fumo irrequieto à minima brisa.
Sorrir é tão natural como cerrar os olhos,
depende da imagem que teima diante de
nós, nessa procura inconsciente
de todo o pensamento,
e que força estala cá dentro
nesse episódio da memória.
Escrever é poder saltar de passado
em passado, e fingir que nada
nos pertence, que somos intocáveis,
que o nosso nome é outro afinal
e o rosto, variados reflexos do
que a luz pode dele fazer.


Fernando M. Dinis
do blog FICO ATÉ TARDE NESTE MUNDO

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